Devemos nos preocupar com a monkeypox?

IFSC VERIFICA Data de Publicação: 30 ago 2022 09:20 Data de Atualização: 31 ago 2022 08:34

Em 23 de julho, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o atual surto de varíola dos macacos (monkeypox) constitui uma emergência de saúde pública de importância internacional. Desde maio, foram notificados mais de 44 mil casos em pelo menos 97 países. No Brasil, o primeiro caso foi confirmado em junho e, atualmente, o País já é o terceiro em número de casos com mais de 4 mil ocorrências confirmadas e 5 mil suspeitas. Dois anos após o mundo enfrentar a pandemia de Covid-19 - que ainda não acabou -, será que teremos outra?

No post deste mês do IFSC Verifica, conversamos com a professora do curso técnico em Enfermagem do Câmpus Florianópolis do IFSC Ângela Kirchner e com a epidemiologista e professora do Departamento de Saúde Pública da UFSC Alexandra Boing para abordar as seguintes questões:

  • - O que é a monkeypox?
  • - Quais os principais sintomas da doença?
  • - Quais os cuidados para evitar a contaminação?
  • - O que fazer em caso de suspeita?
  • - Qual o cenário da doença em Santa Catarina e no Brasil?
  • - Há chance de a monkeypox virar uma pandemia?
  • - Como deve ser a vacinação para a doença?

Varíola dos macacos ou monkeypox?

A monkeypox é uma doença causada pelo orthopoxvírus, da mesma família do vírus que causava a varíola comum, extinta na década de 80. É uma doença que pode infectar tanto seres humanos quanto animais e foi por isso que acabou sendo conhecida como varíola dos macacos - uma vez que a descoberta inicial do vírus foi em macacos em um laboratório dinamarquês em 1958. 

Embora “monkey” signifique macaco em inglês, a professora do IFSC Ângela Kirchner recomenda usar a terminologia científica “monkeypox” ao invés de varíola dos macacos. “É uma tentativa de que a gente minimize os riscos dos pobres animais que acabam sendo vítimas dos seres humanos, que não têm o entendimento de que eles também são meros hospedeiros transitórios, como nós, e que não são os originários”, explica. Inclusive, segundo a OMS, atualmente a maioria dos animais suscetíveis a este tipo de varíola são roedores, como ratos e cães-da-pradaria, e não macacos.

Como a monkeypox é transmitida?

A doença pode ser transmitida por contato direto com uma pessoa contaminada ( por gotículas respiratórias, lesões e fluidos corporais) e indireto, por meio de objetos como roupas, toalhas, roupas de cama, pratos, copos e talheres. Uma pessoa pode transmitir a doença desde o momento em que os sintomas começam até as feridas na pele cicatrizarem completamente. “Diferente da varicela (catapora), que quando já está em crosta a pessoa não precisa mais fazer isolamento, a monkeypox tem que manter o isolamento até acabarem todas as crostas”, alerta a professora do IFSC. Segundo Ângela, em média, esse isolamento dura 21 dias, mas o período dependerá da cicatrização das erupções cutâneas, já que, enquanto elas não sanarem, ainda há risco de transmissão do vírus.

Os principais sintomas da doença são febre, dores no corpo, dor de cabeça, inchaço dos linfonodos (ínguas) e erupções cutâneas (feridas). Ângela alerta que o quadro inicial pode parecer uma gripe e, por isso, é importante que, se houver sintomas, a pessoa já utilize máscara facial - para evitar a transmissão para outras pessoas - e procure um atendimento médico para confirmar ou descartar o diagnóstico da doença. 

-> Tire suas dúvidas sobre a doença neste material desenvolvido pela Diretoria de Vigilância Epidemiológica de Santa Catarina

No vídeo abaixo, a professora do IFSC explica as formas de transmissão da doença e os cuidados que devemos ter para evitar a contaminação:


A confirmação da doença é feita por meio de um teste de PCR - que não é o mesmo feito para Covid-19 - após uma avaliação clínica. “Podem ser pedidos os exames de sangue para diagnóstico diferencial, mas o diagnóstico de confirmação é através do PCR”, reforça Ângela. 

A maioria dos casos é leve e o tratamento é feito com o isolamento em casa e analgésicos para a dor gerada pelas lesões. “A maior parte das pessoas que necessitam de atendimento hospitalar internam para tratar a dor, que é muito intensa, ou ainda pode haver casos em que a pessoa evolua para uma complicação respiratória grave”, explica Ângela. Em 26 de agosto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a dispensa de registro para que o Ministério da Saúde importe e utilize no Brasil o medicamento Tecovirimat, para tratamento da doença monkeypox.

Segundo a professora do IFSC, por ser uma doença nova ainda, não há estudos suficientes sobre sequelas da monkeypox.  “Até o presente,  o que se tem relatado como sequelas são as cicatrizes das lesões, que podem levar à cegueira em caso de lesões nos olhos e a encefalite”, informa.

Ângela explica que, mesmo sendo um vírus que infecta humanos desde 1970, devido a sua característica endêmica, não foram desenvolvidas pesquisas significativas sobre seu comportamento. “Quando dizemos que é uma doença nova, é no sentido de ainda não haver estudos suficientes para apontar respostas consistentes sobre o comportamento e evolução da doença em uma perspectiva de global”, complementa.

Existem grupos de risco quando se trata de monkeypox?

A professora de Enfermagem do IFSC destaca que não existe um grupo que tenha mais chances de contrair a doença, mas que, em algumas pessoas, há mais chance de haver complicações:


A professora do Departamento de Saúde Pública da UFSC Alexandra Boing reforça que agora os casos estão se espalhando para toda a população. “A gente já tem casos em mulheres, grávidas, crianças, adolescentes”, destaca. A epidemiologista esclarece que, quando se fala em grupo de risco, trata-se também das pessoas que podem ter maiores complicações se forem contaminadas. “Quem tem maiores complicações são principalmente as pessoas com imunossupressão e as crianças, então é importante a gente estar atento para esses grupos”, alerta.

Teremos uma nova pandemia?

Embora a OMS já considere o atual surto de monkeypox como uma emergência de saúde pública, a epidemiologista e professora da UFSC destaca que não é motivo para pânico, mas é preciso ficarmos em alerta - uma vez que os números de casos já são expressivos e estão crescendo de forma exponencial. “Mesmo que a monkeypox não assuma maiores proporções, porque ela é diferente da Covid-19 tanto em relação à gravidade como à mortalidade, a gente vai precisar continuar acompanhando, avaliando o impacto e pode sim se tornar um evento pandêmico, mas de proporções diferentes do que a gente vivenciou e está vivenciando com a pandemia da Covid-19”, explica Alexandra.

A professora do IFSC também não descarta a possibilidade da monkeypox virar uma pandemia. No vídeo abaixo, Ângela destaca os cuidados essenciais para evitar que isso aconteça:


O que o Brasil precisa fazer para enfrentar a Monkeypox?

Para a professora do Departamento de Saúde Pública da UFSC, o Brasil não pode cometer os mesmos erros que fez no enfrentamento da Covid-19. Alexandra é uma das autoras de um artigo publicado neste mês por um grupo de pesquisadores de instituições de pesquisas brasileiras e da Comissão de Epidemiologia da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) que sugere ações para o enfrentamento à monkeypox. No artigo intitulado “Monkeypox: o que estamos esperando para agir?”, os pesquisadores criticam a  negligência  e lentidão do Brasil para a resposta ao enfrentamento da doença.

Os cientistas chamam a atenção para a falta de estrutura laboratorial para diagnóstico rápido da monkeypox, a desestruturação dos serviços de vigilância, as limitações de se  estabelecer  um sistema de informação em saúde transparente, ágil e apto para registrar e disseminar dados em tempo real, além das limitadas ações de capacitação aos trabalhadores de saúde e insuficientes iniciativas de comunicação adequadas para a população e de combate ao estigma. 

No vídeo abaixo, Alexandra comenta o que o País deveria fazer para enfrentar a doença:


O artigo foi publicado em 1º de agosto. Na semana passada, em 22 de agosto, o Ministério da Saúde lançou uma Campanha Nacional de Prevenção à Varíola dos Macacos. No entanto, para a professora da UFSC, o Brasil ainda precisa avançar mais nas estratégias e ações para lidar com a doença. Na sua avaliação, a campanha de comunicação do Governo precisa ser mais robusta e efetiva e o plano de contingência recentemente publicado possui muitas deficiências. Apesar de ter havido investimentos e ampliação da capacidade dos laboratórios diagnósticos no País, a epidemiologista considera ainda insuficientes. “A gente precisa avançar de forma importante, com base em experiências internacionais. Sabemos o que precisa ser feito, temos informação e evidência científica disponível, então é necessário implementar”, destaca.

Cenário da monkeypox em Santa Catarina

De acordo com o relatório divulgado pela Diretoria de Vigilância Epidemiológica de Santa Catarina (Dive) em 30 de agosto, o Estado já contabiliza 94 casos confirmados de monkeypox, sendo que os municípios com maior ocorrência até o momento são Florianópolis (34), Joinville (11), Balneário Camboriú (9) e Blumenau (9). Além disso, 291 casos suspeitos estão em investigação. Os dados estão sendo atualizados semanalmente neste site da Dive.

A professora da UFSC observa que este é um número significativo. “É importante sim estarmos em alerta, assim como o país inteiro”, afirma a epidemiologista. Pelo boletim divulgado pelo Ministério da Saúde em 30 de agosto (nº 43 SE 35), Santa Catarina é o sétimo estado brasileiro com maior número de incidência de monkeypox. A atualização dos casos pode ser acompanhada aqui.

Segundo a Dive, todos os serviços de saúde do Estado estão cientes para que haja reforço na identificação precoce dos casos e na orientação da importância do isolamento da pessoa infectada para evitar a transmissão para outras pessoas, em especial aquelas dos grupos mais vulneráveis como crianças, gestantes e imunodeprimidos. Os casos identificados e confirmados são acompanhados pela Vigilância Epidemiológica Estadual. 

-> Veja as notas técnicas publicadas pela Dive alertando as unidades de saúde sobre a monkeypox e com orientações sobre o encaminhamento de casos suspeitos 

Vacinação contra a monkeypox

Uma das estratégias para conter o aumento de casos de monkeypox é a vacinação, que já começou a ser feita em outros países. Em 25 de agosto, a Anvisa aprovou a dispensa de registro para que o Ministério da Saúde importe e utilize no Brasil a vacina Jynneos/Imvanex para imunização contra a monkeypox. O imunizante é destinado a adultos com idade igual ou superior a 18 anos.

A expectativa é que a vacinação na população brasileira seja iniciada nos próximos meses, mas a epidemiologista Alexandra pondera que o número de imunizantes que deve chegar ainda é insuficiente pelo número de casos já registrados e para o tamanho da população que irá precisar dessa vacina. “É importante que a gente tenha uma proatividade do governo em nível nacional para conseguir negociar e conseguir uma quantidade muito maior de vacinas”, avalia.

A princípio, a vacina contra a monkeypox não deve ser uma vacinação em massa - como aconteceu com a Covid-19. “Ela vai ser focada provavelmente em grupos de risco e grupos prioritários e alguma ação específica focada na pós-exposição, ou seja, pessoas que tiveram contatos com casos para que a gente tente quebrar essa cadeia de transmissão”, explica a professora da UFSC.

No Brasil, quem nasceu antes da década de 80 já foi vacinado para varíola comum. No entanto, isso não garante proteção contra a monkeypox. “Pensando que já faz 40 anos, então a gente não tem mais uma imunidade residual que desse conta e não vai fazer uma diferença você ter recebido a vacina”, afirma a professora do IFSC Ângela Kirchner. 

Para a epidemiologista Alexandra, esta é uma questão ainda em aberto. “Apesar de alguns estudos apontarem para uma imunidade de longa duração, a gente sabe também que existe uma perda”, pondera. A professora do UFSC chama a atenção para o cuidado com este tipo de informação, que pode dar a entender que algumas pessoas não precisam se preocupar por já terem imunidade. “Está em aberto, a gente não sabe qual é essa proteção conferida, então a gente precisa realmente lançar mão de estratégias que a gente tem certeza da sua evidência e do seu impacto”, enfatiza.

Cuidados necessários

Ambas as especialistas destacam a importância do uso de máscara e da higienização das mãos para evitar a contaminação pelo vírus que causa a monkeypox. “Os cuidados continuam sendo importantes para evitar a Covid-19 e também para a monkeypox”, ressalta Alexandra. 

A professora do IFSC também lembra que ainda estamos passando por uma pandemia. “A Covid-19 continua fazendo vítimas diariamente, então protejam-se e cuidem dos demais”, recomenda Ângela.

Infográfico com cuidados com a monkeypox

Mais informações

-> Acesse a lista completa de recomendações da OMS relacionadas à monkeypox
-> Acompanhe os casos confirmados de monkeypox pelo mundo num mapa da OMS
-> Acesse a página do Ministério da Saúde com informações sobre a monkeypox
-> Acompanhe as informações da monkeypox em Santa Catarina

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