Quatro evidências científicas de que a Terra é redonda

IFSC VERIFICA Data de Publicação: 01 out 2024 16:58 Data de Atualização: 02 out 2024 14:11

Não é preciso repetir a experiência do cosmonauta russo Iuri Gagarin, que em abril de 1961 foi o primeiro ser humano a viajar pelo espaço e a testemunhar, visualmente, que a Terra é uma esfera azul. É possível confirmar que habitamos um planeta esférico aqui mesmo, com os pés bem plantados no chão. Em alguns casos, inclusive, basta olhar para cima para encontrar essas evidências científicas.

Porém, o fenômeno da desinformação e as iniciativas de grupos organizados que pregam o descrédito na ciência fortaleceram, na última década, a influência de um movimento conhecido como terraplanismo – que busca convencer as pessoas de que a Terra teria um formato achatado, semelhante a uma pizza. Mais do que duvidarem das evidências científicas de que o planeta é redondo, esses grupos alimentam ideias paranoicas em torno de instituições como a Agência Espacial Norte-americana, a Nasa, que seria, para eles, responsável por mentir para a humanidade inteira sobre o formato do planeta, com finalidades políticas.

A influência dos terraplanistas e a adesão a suas ideias é bastante favorecida com a facilidade que esses grupos têm de produzir e disseminar conteúdo – algo proporcionado pelo acesso global às tecnologias digitais e a canais de comunicação como o YouTube e as mídias sociais. O antropólogo Jorge Garcia de Holanda, que estudou o fenômeno do terraplanismo em seu doutorado em Antropologia Social na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), associa a multiplicação e a influência de canais no YouTube e de páginas no Facebook ao aumento no número de pessoas que acreditam na teoria conspiratória da terra plana. Em seu estudo, iniciado em 2019, ele identificou 57 canais terraplanistas brasileiros no YouTube, além de sete grupos no Facebook – o mais movimentado deles, com cerca de 40 mil membros.

O consenso científico de que a Terra é redonda já tem mais de 2 mil anos, como observa o professor Marcelo Schappo, doutor em Física, docente no Câmpus São José e organizador do livro “Armadilhas camufladas de ciência”. Para ele, isso faz com que o principal argumento dos terraplanistas modernos – de que a esfericidade da Terra é apenas uma ideia conspiratória propagada pela Nasa para esconder a “verdade” – não faça sentido. “A Nasa jamais pode ser responsabilizada por ‘formular’ ou ‘descobrir’ a forma da Terra, uma vez que só foi criada em 1958. Inclusive, é o contrário: todas as missões espaciais planejadas pela Nasa e por agências de outros países usou por base o conhecimento já pré-estabelecido sobre a forma da Terra”, argumenta. Logo, as imagens espaciais da Terra produzidas pela agência e pelas inúmeras missões já enviadas ao espaço não revelaram nada de novo: “Já se sabia, e se permanece sabendo, que a Terra é redonda”, reforça o professor.

Algumas dessas evidências são bem simples de entender e, aqui, listamos quatro delas. O ponto de partida é sempre a compreensão de que a Terra é um planeta esférico, levemente inclinado, que gira em torno do Sol e tem a Lua como satélite natural.

Primeira evidência: as constelações

As constelações são agrupamentos de estrelas que formam desenhos imaginários no céu, criados por astrônomos para entender padrões do movimento celeste. Se você estiver em Florianópolis , ou em Johanesburgo, poderá ver o Cruzeiro do Sul, por exemplo, na mesma noite. “Isso só é possível porque as duas pessoas estarão, na verdade, olhando para a mesma direção espacial, que é a direção do eixo norte-sul da Terra”, explica o professor Marcelo Schappo. E isso ocorre porque a Terra é redonda.

Na Terra plana, isso jamais poderia acontecer. “Como, para os terraplanistas, o ‘polo Sul’ não é um ponto, mas sim a “borda da pizza”, então, em Florianópolis e em Johanesburgo, ao se apontar a visão para o Sul, as pessoas estariam olhando para regiões espacialmente distintas e divergentes entre si ao redor da Terra e, assim, não deveriam ver as mesmas constelações.”

Segunda evidência: a face aparente da Lua

Você já ouviu falar no lado escuro da Lua? Ele é assim chamado porque é a face do nosso satélite natural que nunca é visto aqui da Terra. Ou seja: a Lua sempre mostra a mesma parte para a Terra, que é a chamada “face aparente da Lua”. Como explica o professor Marcelo Schappo, o fato de a Terra ser esférica possibilita que pessoas que se encontrem em diferentes locais do globo vejam a mesma face da Lua – mas não com a mesma orientação.

“Tome, por exemplo, uma pessoa em Florianópolis, no Brasil, e outra na Califórnia, nos Estados Unidos. Como são regiões a diferentes latitudes terrestres – Florianópolis a Sul do Equador e a Califórnia a Norte –, então as duas pessoas de pé sobre a ‘bola’ da Terra estarão espacialmente em orientações distintas, e isso faz com que vejam a mesma face da Lua com uma leve rotação de um lugar para o outro”, exemplifica.

No modelo da Terra plana, isso é impossível de explicar. “Para o modelo defendido pelos que acreditam na ‘pizza terrestre’, a Lua fica ‘pairando’ sobre o disco da Terra, se movendo em círculos ao longo do tempo. Ora, se isso é verdade, então alguém posicionado nos Estados Unidos (Hemisfério Norte) e alguém no Sul do Brasil (Hemisfério Sul) deveriam ver faces distintas da Lua quando ela se encontrasse sobre o Equador terrestre. Mas isso simplesmente nunca acontece”, ressalta.

Terceira evidência: os eclipses lunares

Aconteceu há bem pouco tempo, em 17 de setembro de 2024: quando a Lua entra na região de sombra da Terra, formada pela iluminação do Sol sendo bloqueada pelo nosso planeta, ocorre um eclipse lunar. “Ao longo de vários e vários anos, os eclipses lunares acontecem aos montes – em média, dois por ano. Em todos esses casos, a forma da sombra da Terra vista na superfície da Lua é sempre a mesma: circular”, explica Schappo.

No modelo da Terra plana, Sol e Lua “pairam” sobre a “pizza”, realizando movimentos circulares ao longo do tempo. “Assim, esse modelo falha completamente em tentar explicar um dos fenômenos astronômicos que mais chama a atenção do público, e reúne milhares de espectadores cada vez que ocorre. Se a Terra fosse plana, os eclipses da forma como nós observamos simplesmente não poderiam acontecer.”

 

Quarta evidência: as estações do ano

Esta também teve um marco recente, com a mudança do inverno para a primavera, no hemisfério Sul, e do verão para o outono, no hemisfério Norte. No verão tem-se dias mais claros e longos, enquanto no inverno é o contrário. “As estações do ano geram padrões de luz sobre a Terra (dias/noites) que só fazem sentido na Terra redonda”, explica o professor Marcelo Schappo.

Nos equinócios, que marcam o início da primavera e do outono, por exemplo, a duração do dia e da noite é aproximadamente igual em qualquer lugar da Terra, exceto nos polos. Com o Sol sobre a linha do equador, ele terá condições de iluminar exatamente a metade do planeta (toda a face voltada para ele), como sabemos que realmente acontece. “Para isso funcionar no modelo da Terra plana, o padrão de luz do Sol sobre a ‘pizza’ teria que ser tal que iluminasse sempre ‘meia pizza’. Mas como, nesse modelo, o Sol paira acima do disco terrestre, não tem qualquer explicação plausível para justificar esse comportamento”.

Por mais que esse assunto pareça já batido e superado, convém sempre se manter atento à forma como as teorias conspiratórias operam e na influência que elas podem ter em pessoas próximas de nós. O professor Marcelo Schappo salienta que não há nada de inofensivo ou de entretenimento nas ideias terraplanistas. “Mesmo ideias absurdas têm potencial para angariar seguidores que, com o tempo, ao se acostumarem a acreditar em afirmações sem base científica, vão se tornando cada vez mais inimigos da ciência, gerando desdobramentos em atitudes e posicionamentos negacionistas relacionados a outros temas que nada mais terão a ver com a forma da Terra. Assim, a crença aparentemente inócua do terraplanismo pode ser a porta de entrada para a negação das vacinas e do aquecimento global antropogênico, por exemplo, gerando desdobramentos sociais e coletivos bem mais preocupantes”, comenta.

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