PESQUISA Data de Publicação: 11 fev 2021 09:00 Data de Atualização: 17 fev 2021 10:25
O Brasil, e em especial a região da Grande Florianópolis, é um dos poucos lugares do mundo onde o ciclo de cultivo da ostra (espécie Crassostrea gigas) se completa em menos de um ano, quando o normal em outros centros de cultivo é de dois a três anos. Porém, mesmo com esse panorama propício, a maricultura contava com um problema a resolver: a mortalidade de verão em ostras adultas.
Como tudo começou
A vantagem da ostra cultivada nessa região sul do Brasil chegar à fase adulta num período aproximado a seis meses enquanto em outros locais supera a dois anos é ofuscada pela chegada do verão. “Essa imensa vantagem é, no entanto, ofuscada pela chegada do verão, quando as ostras já adultas, e já carregadas de todo o custo de produção, enfrentam as altas temperaturas do mar, comuns nessa época do ano. Eu me interessei pelo projeto e me propus a abraçar uma das possibilidades de pesquisa: o desenvolvimento de tecnologia baseada em refrigeração, minha especialidade. Transformei isso no tema de minha tese de doutoramento e nela trabalhei por cinco anos”, revela Garcia.
Segundo Marcos, o maior desafio foi imposto pelas características do mercado para este tipo de produto, uma vez que mais de 98% das vendas são para ostras vivas, ou seja, processar e congelar o produto não era mais uma opção viável.
“Como a ostra é um animal primitivo e tem todo o seu metabolismo regulado pela temperatura, essa foi a linha de pesquisa adotada: encontrar uma temperatura, ou faixa de temperaturas, que conciliasse o objetivo final de uma ostra viva, saudável, sem imposição de sofrimento e, a viabilidade técnica e econômica de uma solução tecnológica candidata”, relata.
Marcos conta que então chegou ao que, nos artigos submetidos, chamam de Live oysters conservation system (LOCS). “É um sistema técnico que provê água limpa, oxigênio, alimentação natural, e tratamento térmico que possibilitou a conservação de lotes de ostras vivas por até 90 dias, com taxas de mortalidade de 2% e 6%, para 60 dias e 90 dias, respectivamente. A mortalidade medida nos cultivos em mar, para o mesmo período, foi de 56%”, explica o professor.
Garcia ressalta que a solução tecnológica foi encontrada, e demonstrada cientificamente que funciona. “Agora precisamos trazê-la para a escala de produção. Quanto ao investimento necessário, ele diz que depende da produção da fazenda. “Por exemplo, para uma fazenda de 2 mil dúzias por dia, estimamos em 50 mil reais, para a parte de refrigeração”, projeta. Atualmente, ele busca financiamento para a construção de uma planta piloto.
"O sistema desenvolvido pelo professor Marcos Antônio Garcia entra como solução. Ele desenvolveu, simplisticamente falando, o paiol ou silo para ostras. Projetou um sistema de armazenamento e conservação de ostras “in door“ baseado em terra. Esse sistema fornece as condições ideais para que os bivalves mantenham o melhor de suas qualidades quando da colheita e assim às mantenham por meses prolongando em muito o prazo de comercialização. Mas o mais importante é que ao serem colhidas antes das condições adversas de verão das águas das baías catarinenses, onde o cultivo dessa espécie é responsável por 90% da produção nacional, é o controle da taxa de mortalidade. As perdas ficam extremamente reduzidas pois, as ostras submetidas a condições ótimas que lhe garantem baixo metabolismo, resultam em mortalidades praticamente nulas. Encontramos uma saída para driblar os prejuízos causados pela mortalidade em massa de verão que acompanha a ostreicultura catarinense desde sua gêneses no fim da década de 80", destaca Nelson.
Na prática
A primeira busca pela solução para diminuir a mortalidade de verão foi estudar o comportamento da ostra, animal influenciado pela temperatura, e como ela se comporta com cada faixa de temperatura. “Daí descobrimos que se tivéssemos água do mar a menos de 18ºC ela inibia o gatilho biológico da grande causa de mortalidade. Foi um desastre, porque a 18ºC a ostra filtra 5 litros de água por hora, cada ostra. Então ao fazer uma conta de um cultivo de 200-300 mil ostras, e tendo que reduzir a temperatura de 30ºC para 18ºC, faz-se necessário uma muita energia para o cultivo”, expõe o docente de Refrigeração e Climatização.
Engenheiro Mecânico de formação, Marcos Antonio passou a estudar os cultivos de ostras no Canadá. “E aí, acontece aquelas mágicas da pesquisa”, revela ele, que considerava quase perdido o trabalho. As ostras de lá tem um comportamento que se assemelha à hibernação, de metabolismo basal, que consome pouco oxigênio e pouca comida. Daí comecei a buscar se as ostras que se criam aqui não teriam comportamento de metabolismo basal”, argumenta ele. Em bibliografias francesas, encontrou pesquisas para faixas de temperatura de 10ºC. No entanto, também não obtiveram sucesso com os experimentos.
O próximo passo foi adicionar ao sistema técnico, primeiramente desenvolvido para controle de temperatura e alimentação, o tratamento de água. Pronto! 90 dias de sobrevivência de ostras, o que é suficiente para a passagem do verão.
Além do pedido de patente, Marcos Antônio apresentou o trabalho em eventos científicos no Chile e Espanha. O artigo também já foi aceito em revista A2.
Saiba mais
Santa Catarina responde por mais de 3 mil toneladas/ano de ostras; com uma média de 700 cultivos, gerando cerca de cinco mil empregos. A maricultura oportuniza ainda a revitalização de comunidades litorâneas.
Garcia destaca as condições locais para a ostreicultura. “A temperatura do mar muito favorável é de 17º C, salinidade de 35%, com abundância de nutrientes trazidos da pluma da Bacia do Prata”, menciona ele em sua tese de doutorado, que cita também as formas de cultivo mais comuns no Brasil: Espinhel e Suspenso fixo.