PESQUISA Data de Publicação: 19 mai 2023 09:28 Data de Atualização: 30 jul 2023 22:21
Econômicas, ecológicas, bonitas e sustentáveis: não são poucos os atributos das edificações feitas em taipa de pilão. O sistema construtivo milenar, que consiste basicamente na construção de paredes por meio do apiloamento/compactação de camadas de terra crua em formas de madeira, vem sendo estudado e aprimorado por pesquisadores do Câmpus São Carlos do IFSC. Após várias etapas do estudo analisando corpos de prova, nesta semana a equipe deu início à construção da primeira parede de taipa de pilão em escala real, fazendo uso do taipal (forma) desenvolvido por um dos estudantes do grupo em seu trabalho de conclusão do curso de Engenharia Civil.
O professor Anderson Renato Vobornik Wolenski, que atua na área de Estruturas e Tecnologias da Construção Civil e coordena a pesquisa, participou do grupo de trabalho que elaborou a Norma Técnica 17014/2022 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). A norma define os requisitos, procedimentos e controle para edificações que usem a taipa de pilão. Segundo ele, a publicação dessas diretrizes é um movimento importante para que a taipa de pilão passe a ser mais utilizada e ganhe visibilidade. “A norma ratifica e dá respaldo científico à técnica, e isso garante a segurança”, explica. A perspectiva é que, com a normatização, a técnica passe a ser mais adotada na construção civil – o que dá relevância, também, para as pesquisas em torno dela.
Os estudos em desenvolvimento no IFSC contam com apoio de dois editais da Pró-Reitoria de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação (Proppi) e integram as atividades do Núcleo de Pesquisas Aplicadas à Construção Civil. Nos últimos dois anos, os pesquisadores trabalharam na caracterização dos solos dos municípios de São Carlos, Palmitos e Águas de Chapecó, com o objetivo de identificar as diferenças na aplicação da técnica em função das peculiaridades de cada região. Cor, granulometria, textura e formação rochosa são características que podem variar entre um solo e outro, mesmo se tratando de amostras coletadas em cidades vizinhas. Com isso, explica Anderson, é preciso ajustar os procedimentos para a execução da taipa – que envolvem, além da compactação da terra propriamente dita, a adição uma porcentagem de cimento e areia e o controle da umidade ideal.
Taipa feita a muitas mãos
Não é exagero afirmar que a taipa de pilão é um sistema construtivo milenar: há construções de terra erguidas há mais de 2 mil anos, em países como Egito e Marrocos. Uma amostra da taipa do século 21, aprimorada pelos jovens pesquisadores do IFSC, foi apresentada na Feira de Inovação do Seminário de Ensino, Pesquisa, Extensão e Inovação (Sepei 2023), no Câmpus Joinville, em abril deste ano. No estande, os visitantes puderam conhecer a técnica e ajudar a sobrepor as camadas de terra que foram apiloadas no molde de 1 metro de altura. Como propositalmente a terra utilizada era de diferentes procedências, o bloco formado apresenta camadas bem nítidas – para a última, os pesquisadores acrescentaram terra joinvilense. Um total de 38 pessoas de 16 câmpus da instituição contribuíram para a formação da taipa coletiva, que agora está em exposição no Câmpus São Carlos.
As vantagens da taipa de pilão em relação a outros sistemas construtivos são diversas. Enquanto o concreto, amplamente utilizado, é um material não renovável – ou seja, ele não se degrada quando descartado, o que provoca alto impacto ambiental – a taipa de pilão é o que se pode chamar de “bioconstrução”. As edificações podem ser feitas com a terra do próprio terreno onde o imóvel vai ser construído, o que gera economia e dá bom aproveitamento para um material precioso que, com outras técnicas, acabaria descartado. As paredes resultantes são termoacústicas, ou seja, isolam ruídos e equilibram a temperatura interna; são respiráveis, o que proporciona um ar mais saudável para os moradores; e têm um aspecto arquitetônico contemporâneo, comparável ao acabamento sofisticado do concreto aparente.
O resultado é distinto da técnica conhecida como pau-a-pique, que utiliza terra e estruturas de bambu ou madeira para compor as paredes e é bastante comum no Brasil. Segundo Anderson, esse tipo de taipa não possui função estrutural, o que exige dela pilares e vigas, em geral, executadas com madeira roliça rústica. Para que uma edificação de taipa de pilão resista ao tempo, porém, é preciso manutenção adequada, com aplicações periódicas de produtos hidrorrepelentes – que impeçam a infiltração de água e mantenham, ao mesmo tempo, a respirabilidade do material.
Sustentabilidade e afetividade
A afetividade é outro diferencial destacado por Anderson. “Com a taipa de pilão, nós ressignificamos o sentido de edificação, de modo a levar afetividade entre o morador e sua moradia e ampliar o acesso a edificações mais sustentáveis”, diz ele. Pesquisas em busca de edificações sustentáveis são importantes, afirma, em função do paradigma dominante na construção civil que preconiza o uso de materiais não renováveis, como o concreto. “É preciso quebrar esse paradigma e a taipa de pilão é uma alternativa exitosa nessa direção”, diz o professor.
A pesquisa da equipe do Câmpus São Carlos espera manter a taipa de pilão como objeto de estudo nos próximos anos. Segundo Anderson, há expectativa de viabilizar parcerias com outras instituições e empresas para aplicar o conhecimento desenvolvido em experiências construtivas reais. Interessados em conhecer o trabalho mais detalhadamente podem escrever para anderson.wolenski@ifsc.edu.br. Os experimentos da pesquisa são registrados no perfil @projetotaipadepilao, no Instagram.